quinta-feira, 25 de junho de 2009

Departamento Nacional de Registro do Comércio

PARECER JURÍDICO DNRC/COJUR/Nº 132/04
REFERÊNCIA: Processo MDIC nº 52700-000279/04-70
EMENTA: ALTERAÇÃO CONTRATUAL – DELIBERAÇÃO MAJORITÁRIA – INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA RESTRITIVA: É admissível o arquivamento de alteração contratual produzida e assinada por sócios titulares de maioria de capital social, desde que nos atos anteriores, não exista cláusula restritiva (art. 35, VI da Lei nº 8.934/94 e art. 53, VII do Decreto nº 1800/96).


... Por seu turno, a Lei nº 8.934, de 18.11.94, proíbe o arquivamento de alteração contratual a qual falte a assinatura de algum quotista, quando o contrato contiver cláusula restritiva de deliberação por maioria, que não é o caso presente. Diz o art. 35, VI, da mencionada lei:

“Art. 35 – Não podem ser arquivados:

VI – a alteração contratual, por deliberação majoritária do capital social,
quando houver cláusula restritiva;”

44. No mesmo sentido é o Decreto nº 1.800, de 31.01.96, que dispõe:

“Art. 53 – Não podem ser arquivados:

..........................................................................................................................

VII – a alteração contratual produzida e assinada por sócios titulares de maioria do capital social, quando houver, em ato anterior, cláusulas restritivas;”

“Art. 54 – A deliberação majoritária, não havendo cláusula restritiva, abrange também as hipóteses de destituição da gerência, exclusão de sócio, dissolução e extinção de sociedade.”

45. O renomado comercialista José Edwaldo Tavares Borba, em sua obra “Direito
Societário” (Manuais Freitas Bastos, pág. 91), ao analisar as sociedades por quotas de
responsabilidade limitada, discorrendo sobre poderes da maioria, manifesta-se na forma como segue:

“54 - Poderes da maioria e alteração do contrato social

.................................................................................................................

O contrato social terá a liberdade de estipular a maioria necessária para as deliberações comuns e especiais. Em regra, as decisões são tomadas por sócios que representem a maioria do capital: 50% das cotas mais uma. Nada impede, entretanto, que o contrato estabeleça maiorias especiais, exigindo, por exemplo, a manifestação favorável de 2/3 do capital, ou até da unanimidade, para certas deliberações ou mesmo para todas.
É comum exigir-se maioria especial para as deliberações que importem na alteração das cláusulas mais importantes do contrato social.”


46. No mesmo sentido, o Prof. José Maria Rocha Filho esclarece que:

“Na atualidade, pois, o princípio da maioria está consagrado não só na doutrina e na jurisprudência, mas, também, na lei. E, por isso, as Juntas Comerciais voltam a admiti-lo. Assim, ele só não será observado, via de regra, se existir, no contrato social, cláusula proibindo sua aplicação.” (in Curso de Direito Comercial – Parte Geral, pág. 295).

47. A título de ilustração trazemos a lume a manifestação da Procuradoria da Junta Comercial do Estado de São Paulo – JUCESP, sobre o mandado de segurança por meio do Parecer nº 02/86, impetrado contra o Presidente daquela Autarquia, que visava desconstituir um arquivamento de alteração contratual sob a alegação de ilegalidade porque o instrumento não estava assinado por todos os sócios, cujos trechos achamos conveniente transcrever:

“(...)
1. Está mais do que pacificado na jurisprudência dos Tribunais o entendimento de que o disposto pelo art. 38, V da Lei 4.726 – que dispõe sobre o Registro do Comércio – não prevalece quando a lei específica do tipo societário consagra a validade das decisões majoritárias. Tal colocação foi superiormente exposta pelo Ministro Rodrigues Alckimin no Rev. nº 76.710 (Rev. Trimestral de Jurisprudência, vol. 70/777), cujo acórdão tem a seguinte ementa:

“Sociedade por quotas. Alteração do contrato social por deliberação da maioria dos sócios (Lei 3.708/19, art. 15). Registro do contrato de que não consta assinatura do sócio dissidente. Legitimidade. Inexistência de ofensa ao art. 38, V, da Lei 4.726/65, que não revogou a norma do art. 15 da Lei 3.708 – Recurso não provido.”

No seu voto vencedor explanou a tese:

“Não se me afigura interpretação melhor supor que a formula adotada na Lei 4.726/65 – ressalvando a legitimidade da alteração quando o contrato social a admita sem a concordância de todos os sócios – excetua a mesma legitimidade quando a lei, ao dispor sobre determinado tipo societário, expressamente assegure aos sócios em maioria igual direito. Tenho, portanto, que a regra do art. 35, V, se há de interpretar como permissiva do registro nos casos em que, sem que a lei autoriza alteração do contrato social pela só
vontade da maioria, o contrato social o admita, não excludente do registro nos casos em que a própria lei, ao regular os caracteres da sociedade, entre eles inclui a reformabilidade do contrato pela manifestação da maioria.”

A partir deste acórdão firmou-se o entendimento de que, na sociedade por quotas de responsabilidade limitada, mesmo no silêncio do contrato social, lícita é a alteração contratual deliberada e assinada por sócios representando a maioria do capital.

Expõe, com a clareza que lhe é peculiar, Hernani Estrela, a mesma verdade (Rev. Dos Tribunais vol. 487/420), sintetizando assim:

“3. Pelo que se colhe do art. 38, nº V, dessa lei ela teria vindo dar sanção legislativa aquela prática contratual, tanto que fez a ressalva, quanto à falta de assinatura de todos os sócios, no caso em que for contratualmente permitida deliberação por simples maioria. Agora, pois, tem-se, com respeito às deliberações majoritárias que podem
modificar o contrato social, dois regimes diferentes. Um que é o tradicional, vige exclusivamente para as sociedades de pessoas, regidas pelo Código (arts. 300 a 353); outro que rege as sociedades por cotas. No primeiro, a maioria pode deliberar unicamente sobre negócios pertinentes à gestão ordinária da sociedade. “salvo no caso em que for contratualmente permitido deliberação de sócios que representem a maioria do capital social”. No segundo, ao revés, a maioria, semelhantemente ao que se dá em relação às sociedades por ações, pode livremente alterar o contrato social, restando, tão-só, ao que divirja de tal resolução, retirar-se da sociedade (lei cit. Art. 15).”

Veja-se, a respeito, o acórdão da 5ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, no recurso ex-officio nº 192.684, com o oportuno comentário de Egberto Lacerda Teixeira (Rev. de Direito Mercantil, nº 12/87-91).

2. Deste modo, ao Registro do Comércio, executado pelas Juntas Comerciais, não cabe recusar o arquivamento de instrumento de alteração do contrato de sociedade limitada, quando assinado apenas por sócios representando a maioria do capital social. Revestido dos demais requisitos de ordem formal, o instrumento será arquivado para os fins
ditados pelo art. 301 (parte final), combinado com o art. 307, ambos do Código Comercial. (Fls. 23 do Parecer Jurídico DNRC/COJUR/Nº 132/04 Processo MDIC nº 52700-000279/04-70)
Nestas condições, não houve a alegada violação do art. 38, V da Lei 4.726/65, como alegam os impetrantes, na fundamentação do pedido.” (...)

48. Com efeito, não há como afastar que as deliberações societárias tomadas pela vontade expressa da maioria representativa do capital social da sociedade, conforme ensina o renomado comercialista Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto (Sociedade por Quotas de Responsabilidade Limitada, vol. I, págs. 212 e 213.

49. Dessa forma, são licitas as deliberações sociais, desde que decididas pela maioria
do capital social. E, neste diapasão, temos o ensinamento do Professor Rubens Requião, ao citar João Eunápio Borges (Curso de Direto Comercial, 1º volume, pág. 348)
50. No Direito Brasileiro, a exclusão de sócio era fundada na lei ou no contrato e,
conforme ensina o douto MIGUEL REALE (in “Nos Quadrantes do Direito Positivo, Ed. Michalany Ltda., pág. 282) que, ao elaborar estudo sobre a matéria, sustenta idêntico ponto de vista:

“Por estes motivos, a nossa doutrina já pode ser considerada pacífica pelo menos em um ponto: a exclusão forçada de um sócio por deliberação dos seus pares, representando a sociedade, quando não resultar das duas causas legais, só poderá se verificar em virtude de expressa estipulação contratual.”

51. No presente caso, o contrato social originário e a 1ª Alteração Contratual não estabelecem qualquer cláusula restritiva, impedindo a deliberação majoritária, portanto, no mérito, não pode prosperar essa assertiva da sociedade PUBLICIDAD SARMIENTO S/A, visto que, no caso em tela, não há cláusula proibitiva quanto à deliberação majoritária.

52. É verdade que, se o contrato social não prevê essa possibilidade é diferente, porque então as partes teriam pactuado previamente criando esse direito e estariam obrigadas ao
pacto a que livremente aderiram. Fora daí não há como admitir-se tal conduta.

53. Além do mais, a legislação em vigor à época limitava-se a dizer que as Juntas
Comerciais poderiam efetuar os arquivamentos nas hipóteses em que a lei admite aqueles procedimentos que, no caso, trata-se de arquivamento de alteração contratual, que decidiu pela exclusão contratual, por deliberação majoritária.

54. Não é outro o entendimento deste Departamento que, com fulcro no inciso VI do
art. 35 da Lei nº 8.934/94 e inciso VII do art. 53 do Decreto nº 1.800/96, tem-se manifestado no sentido de admitir o arquivamento de alteração contratual produzida e assinada por sócios titulares de maioria de capital social, desde que nos atos anteriores não exista cláusula restritiva, conforme se observa dos vários Pareceres Jurídicos exarados pela Coordenação Jurídica deste DNRC, trazidos a cotejo pela sociedade recorrida PUBLICIDAD SARMIENTO S/A.
(Fls. 24 do Parecer Jurídico DNRC/COJUR/Nº 132/04 Processo MDIC nº 52700-000279/04-70)


55. Ora, se as leis citadas remetem o exame da admissibilidade para o direito substantivo, é evidente que não quiseram criar, nem criaram, hipóteses novas. E, na sistemática de nosso direito tais atos só têm aparo se previstos contratualmente ou se acordados por todos os sócios. Fora daí só o Poder Judiciário, em ação própria, poderá apreciar.

56. Ademais, pelo que consta do processo, não mais subsiste a affectio societatis, em
face da manifestação da sociedade DMB/S SERVIÇOS LTDA. ao expressar sua vontade em excluir a sociedade PUBLICIDAD SARMIENTO S/A do quadro societário.

57. Como é cediço, para o para o bom desenvolvimento das atividades desempenhadas pela sociedade, a affectio societatis deve estar presente, por se tratar de um vínculo de confiança que une os sócios.

58. Resumindo, afigura-se, pois, do exame do presente processo à luz dos dispositivos legais vigentes à época da assinatura da 2ª Alteração Contratual da sociedade DMB/S SERVIÇOS LTDA., os motivos que indicam ser incensurável a decisão da JUCESP ao deferir o arquivamento das alterações contratuais de que se cogita, porque extrínseca e formalmente corretas, sem, portanto, violar os incisos I e VI do art. 35 da Lei nº 8.934/94.


DA CONCLUSÃO


59. Diante disso e considerando a orientação jurisprudencial dominante, no sentido de que não compete às Juntas Comerciais dizer da “nulidade ou invalidade das decisões tomadas pelas partes no exercício de seus direitos privados”, agiu com acerto a JUCESP ao proceder o arquivamento das alterações contratuais da sociedade DMB/S SERVIÇOS LTDA. de que se cogita, porque formalmente corretas.

60. Dessa forma, pelas razões de fato e de direito colacionadas neste processo, tem-se, claramente, que a decisão do Eg. Plenário da JUCESP merece reparos, razão qual opinamos pelo conhecimento e provimento do recurso interposto pela sociedade KALÍTERA ENGENHARIA LTDA., a fim de ser reformada a decisão que determinou o desarquivamento relativo à 2ª e à 3ª Alterações Contratuais da sociedade DMB/S SERVIÇOS LTDA., por não restar configurada, naqueles atos, violação de preceitos legais.

61. Isto posto, sugiro o encaminhamento do presente processo à Secretaria do Desenvolvimento da Produção, conforme minutas de despachos anexas.

É o parecer.

Brasília, 30 de setembro de 2004.

MARÍLIA PINHEIRO DE ABREU
Assessora Jurídica do DNRC